quarta-feira, 25 de março de 2020

Lide de Alfaiates - Sacaparte - MONARCHIA LVSYTANA - Frei Francisco Brandão


Q V I N T A
P A R T E   D A
MONARCHIA
LVSYTANA.

Que contem a historia dos Primeiros 23. annos DelRey D. Dinis
Offerecida à Real  Magestade de ElRey Dom Ioão o Quarto Nosso Senhor
XVlll. dos naturaes Reys  desta Coroa.



Escrita pelo Doutor Fr. Francisco Brandão, Monge de Alcobaça,

Chronista Mòr de Portugal, Calificador do S.Officio, Examinador do Tribunal da Consciencia, & Ordens.

Com todas as licenças necessarias.

Em Lisboa na Officina de Paulo Craesbeeck. Anno 1650.


Páginas 121 a 123

CAPIT. LII.

Da guerra que fez a Ca-
stella Dom Aluaro Nunes
de Lara cõ gente do Imfan-
te D. Afonso de Portugal: &
da historia de nossa
Senhora de Sa
caparte.

1286

                   Por este tempo, em que vai a historia, andaua em Portugal desauindo com elRey Dom Sancho de Castella Dom Aluaro Nunes de Lara, filho de Dom Ioão Nunes de Lara, & a causa de andar desauindo com aquelle Rey, era por desualido por lhe cercar a seu pay Dom João Nunes de Lara na Cidade de Albarrasin dous annos antes, com fauor delRey Dom Pedro de Aragaõ, que ganhando a Cidade, a deu a seu filho Dom Fernando, desaposando della ao Dom Ioão Nunes, a quem pertencia por via da mulher Dona Teresa Alueres de Asagra. Esta occasiaõ de quebra, sobre as que já os Laras tinhão, quando intentaraõ daquella Cidade encontrar as cousas delRey D. Sancho acostados a Nauarra  cõ fauor delRey de França, foi a que trouxe a Dõ Aluaro a Portugal, que então era valhacouto dos caualeiros do Reyno de Castella, & o serà daqui adiante com Rey separado, como bem sentia o grande Duque de Alua. Entendia D. Aluaro que o padrinho de sua recõciliação com elRey auia de ser o desasossego com que o naõ deixasse viuer seguro: & Como era homem orgulhoso, & de espirito, & por tal conhecido em ambos os Reynos, conuocãdo gente, & amigos de hum, & outro, começou a fazer guerra nas fronteiras de Castella pela parte de Riba de Coa, em que ouue grandes perdas, & roubos, sem que elRey Dõ Dinis pudesse ir a mão, nem atalhar as demasias deste hospede, antes se presume, que o Infante D. Afonso lhe daua ajuda por Alentejo, que veio a ser occasiaõ de nouas quebras cõ elRey seu irmão, de que falaremos no anno seguinte, em que elRey redusio tudo, & accomodou a Dom Aluaro Nunes.

                   Acompanharão a Dõ Aluaro nestas guèrras dous caualeiros da familia dos Nouaes, & Barundos filhos de Sueiro Gonçalues de Barundo, & de Dona Tereja Pires de Nouaes, irmãos do Mordomo mór do nosso Infante D. Afonso, que mostra bem  ser elle coadjutor nestas cousas, & renderaõ a morte a ambos os irmãos em hum recontro junto a villa de Alfaiates, como escreue o Conde D. Pedro nestas palauras.

          Ε ο sobredito Fernão Soares, & Sentil Soares, irmãos de Pay Soares Mordomo do Infante D. Afonso morrerom na lide de Alfaiates, quando lidou D.  Aluaro Nunes de Lara cõ os Conselhos de toda a terra, sendo eles vassalos de Dom Aluaro e o sobredito Esteuão Soares, irmão deste Fernão Soares, morreo na lide de Tegante com Dom Nuno o bom, cujo vassalo era.

                   Appellidaraõ e estes caualeiros, Soares, por razão do pay, que se chamaua Sueiro. Estoutro recontro de Tegante não sei se seria por este mesmo tempo, que os autores sò fazem menção agora de assistir cà em Portugal a Dom Aluaro Nunes.

                   O manuscripto da Torre do Tombo, não diz que foi esta lide em Alfaiates, senão em Alfaraós, poderà ser que fose vicio do escreuente, pois vemos que outros exemplares dizem, Alfaiates. Nesta Villa ha hũa tradição acerca da Ermida de nossa senhora de Sacaparte, que concorda com isto.

                   A Igreja de nossa senhora de Sacaparte situada meia legoa de Alfaiates, & em seu limite, entre esta Villa, & a Aldea da Ponte; sua origem dizem ser, que tendo batalha hũ Rey deste Reyno com o de Castella no lugar sobredito, vendose ao pôr do Sol em aperto, começou a dizer: Virgem sacainos a boa parte, & logo assi succedeo, ficando com toda sua gente para a parte da sua terra. Em gratificaçaõ querem mandasse edificar esta casa, & lhe desse a inuocaçaõ de nossa Senhora de Saco a parte, ou Sacaparte, como agora lhe chamão. Naõ ha em nossas historias noticia de batalha alguma entre os Reys de Portugal, & Castella naquelle lugar; donde me persuado, que o caso que anda em tradiçaõ, succedeo nesta lide de Dõ Aluaro Nunes de Lara, por ser no mesmo destricto de Alfaiates, & com os Confelhos das terras circumuisinhas. Administrase a Igreja pela Camara, que nomea Ermitão, & Mordomo, que cõ os oficiaes sae em pelouro: no alto do retabolo estão as armas reaes.

                   He Igreja mui capaz; dentro tem hum poço muito fermoso, cuja agoa faz milagres nos enfermos, particularmente de maleitas o sitio he agradauel em hum valle muito grande, & aprasiuel, com huma fonte, & tanque: tem hospital capaz de muita gente. Nos Sabbados da Quaresma concorre muita, & em todos ha prègação; concorrendo nelles as villas do Sabugal, Villar maior, & Castel mendo com muitos lugares de seus termos, alem do de Alfaiates. Na primeira, & segunda oitaua da Pascoa tornão os mesmos pouos em Romaria, & pelo Spirito Santo vem todo o termo de Castel mendo com a mesma Villa com sina leuantada, & muita gente de caualo lusida, que festejão ao redor da casa. De cada lugar do dito termo vem hum homem nú da cintura para sima, & descalço com hũa tocha muito fermosa, & o da Villa cõ ventagem; por todas saõ vinte, que costumão pesar cento & triñta arrateis, huns annos por outros.

                   Esta deuação dizem tèr principio de auer naquella terra hum monstro, que destruia campos, & gente, fizerão promessa à Senhora de vir nesta forma a sua casa cada anno no dia sobredito, com que se virão liures, & apregoão que faltando hum anno, se viraõ outra vez perseguidos delle. Cada anno se fazem tres feiras, nas tres festas principaes da Senhora, Annunciaçaõ, Assumpςaõ, & Natiuidade. Obrou milagres em algũs nauegantes seus naturaes, que em agradecimento lhe derão peças, & vestidos; he cafa prouida de muitos ornamentos.

                   Em outro recontro, que o mesmo D. Aluaro Nunes teue, andando na Comarca de Tralosmontes, visinho às fronteiras do Reyno de Leão, matarão tambem a Nuno Rodrigues Bocarro, filho de Ruy Nunes de Chacim, & casado em Lisboa com Dona Maria Migueis, filha de Miguel Fernandes colaço do nosso Rey D. Afonso Terceiro. Este fidalgo viuia naquella Comarca, por serem herdados nella os deste appellido de Chacim, que he junto da villa de Moncoruo. Delle diz o Conde Dom Pedro:
           Este Nuno Rodrigues Bocarro, filho de Rui Nunes sobredito, matarãono em Riba Douro sobre Miranda apar de huns moinhos, hu andaua em companhia de Dom Aluaro Nunes de Lara, & hia em partimento de huma lide.

terça-feira, 24 de março de 2020

Lide de Alfayates - Sacaparte - Santuario Mariano - TomoTerceiro -




SANTUARIO MARIANO.

E Historia das Imagens milagrosas
DE NOSSA SENHORA,


TOMO TERCEYRO,

QVE CONSAGRA. , OFFERECE. , E DEDICA.
Ao Excellentissimo Senhor Marquez De Fontes
D. RODRIGO PEDRO ANNES DE SA,
Almeyda, & Menezes,

Fr. AGOSTINHO DE SANTA MARIA, 
Ex-Diffinidor gèral da Congregaçaõ dos Descalços de Santo Augustinho de Portugal, & natural da Villa de Estremoz, & Chronista da mesma Religião


LISBOA,

Na Officina de ANTONIO PEDROZO GALRAM
Com todas as licenças necessarias.


Anno de 1711.



Livro II. Título XII.

Páginas 189 a 192




TITULO XII.
Da milagrosa Imagem de Nossa Senhora de Sacaparte.

                   Em o Bispado de Lamego, sobre Riba Coa, está a Ermida, & Santuário de nossa Senhora de Sacaparte, situada meya Iegoa da Villa de Alfayates, & em o seu limite, entre esta Villa & a aldea da Ponte, & perto da Villa do Sabugal, situada em hum campo aonde não ha mais que a Casa da Senhora a do Ermitaõ, & as casas de romagem. A origem desta Santa Imagem segundo a tradiçaõ; porque ainda que querem afirmar os daquella terra, que ella se ache nas historias antigas deste Reyno, nem sabem dizer em que tempo foy, & com que Rey. Dizem que tendo batalha hum Rey de Portugal com outro de Castella, no mesmo lugar, em que hoje se vé a Ermida; vendose o Rey Portuguez ao pór do Sol em grande aperto, começára a dizer: Virgem sácanos a boa parte; & que logo assim succedéra, ficando com toda a sua gente para a parte da sua terra, & que em gratificaçaõ do beneficio lhe mandara o tal Rey edificar aquella Casa, & lhe dera a invocaçaõ de nossa Senhora de Sacouaparte, ou de Sacaparte, como agora lhe chamão. O Padre Vascõcellos na sua Descripçaõ faz este Santuario muyto antigo; porque diz que  quando os Mouros foraõ lançados daquellas terras, era ennobrecida esta Casa da Senhora com milagres, & maravilhas, & a Senhora venerada de todos os fieis.
                
                Nas nossas Historias Portuguezas naõ ha noticia de batalha alguma entre os Reys de Portugal, & CastelIa (ou Leaõ) em aquelle lugar, se assim parece, que este sucesso que refere a tradiçaõ, he huma batalha que deu Dom Alvaro Nunes de Lara, que foy nesta forma.

                   Estava desavindo Dom Álvaro Nunes de Lara, Senhor naquelles tempos poderoso, & de muytos vassallos, com ElRey Dom Sancho o Bravo, filho de Dom Affonso chamado o Sabio. A causa desta quebra, & cahida da graça daquelle Rey , era por lhe cercar a seu pay Dom Joaõ Nunes de Lara na Cidade de Albarrazin, dous annos antes, como favor delRey Dom Pedro de Aragaõ, que ganhando a Cidade, a deu a seu filho Dom Fernando, desapossando della a D. Joaõ Nunes de Lara, a quem pertencia. Esta occasiaõ de quebra, com outras que ja tinhaõ os Laras, quando intentáraõ encontrar naquella Cidade as cousas delRey Dom Sancho, acostados a ElRey de Navarra, com o favor do de França, foy a que trouxe a Dom Álvaro a Portugal, que era naquelle tempo o valhacouto dos descontentes de Castella. Entendia Dom Álvaro que o mayor padrinho de sua reconciliação com ElRey, havia de ser o desassosego em que o trazia, & como era orgulhoso, & de grande espirito, & por tal conhecido em ambos os Reynos, convocando gentes, & amigos de hum, & outro, começou a fazer guerra nas fronteyras de Castella, pela parte de Riba Coa, em que ouve grandes roubos, & destruições, sem que o nosso Rey Dom Dinis (em cujo tempo isto succedeo) lhe pudesse ír à maõ, nem atalhar as demasias deste hospede. E se entende que era assistido, & ajudado do Infante Dom Affonso Irmão delRey Dom Dinis, como se colhe do Conde D. Pedro no titulo 65. Em estas palavras:
E o sobredito Fernaõ Soares, & Sentil Soares (eraõ estes fidalgos filhos de Sueyro Gonçalves de Barrundo, & vinhaõ em companhia do Lara) Irmãos de Payo Soares Mordomo mór do Infante Dom Affonso, morréraõ na lide de Alfayates, quando lidou D. Alvaro Munes de Lara com os Concelhos de toda a terra, sendo elles vassalos de Dom Álvaro.
                   Ainda que nos manuscriptos da Torre do Tombo se diz que esta lide foy em Alfaraós, entendese ser erro do escrivaõ, porque de outros exemplares se vé Alfayates.
                   
                    Com que da historia da lide, naõ consta nada, que toque à origem da Senhora; porque esta foy no tempo delRey Dom Dinis, & a Senhora he muyto mais antiga. Poderiaõ em algum recontro destes do Lara acharemse os naturaes de Alfayates em grande aperto, & valeremse do patrocínio da Senhora, invocando-a em seu favor, para que ella os livrasse, & puzesse em boa parte. E deste milagre, que podia ser muyto grande, a começariaõ a invocar com o titulo que hoje tem, deyxado o que antigamente tinha, como o vemos na Senhora do Incenso.        
                   
               Administra-se esta Igreja pela Camera de Alfayates, a quem pertence o nomear Ermitaõ, & Mordomo, que com os officiaes sahe em pelouro. No alto do retabolo se vem as Armas Reaes de Portugal, em que se vé, deviaõ os Reys (pelas maravilhas que Deos obrava pela invocaçaõ daquella Imagem de sua Santissima Mãy, & continuamente obra) mandarlho fazer. A Igreja he muyto grande , & capaz dos concursos, que sempre alli ha. Dentro nella tem hum fermoso poço, cuja agua faz grandes milagres nos enfermos, particularmente de cezoens, & maleitas. O sitio he agradavel, & he hum valle muyto grande, & aprazível, com huma fonte, & tanque. Tem Hospital, ou casas de romagem, capaz de muyta gente. Nos Sabbados da Quaresma he grande o concurso de povo, & em todos ha Sermão, & concorrem nestes dias as Villas do Sabugal, Villar Mayor, & Castello Mendo, Castello Bom, & outras, & ainda de Castella vem de muytas Villas & lugares a venerar a esta Santissima Imagem.
                   
                         Na primeyra, & segunda Oitava da Pascoa, tornaõ os mesmos povos em romaria à Senhora, & pelo Espirito Santo vem todo o termo de Castello Mendo com a mesma Villa, com círio levantado, & muyta gente de cavallo, bem luzida, que festejaõ ao redor da Casa da Senhora. De cada lugar do dito termo vem hum homem nu da cintura para cima, & descalço com huma tocha grande, & o da Villa com ventagens; por todas saõ vinte, que costumão pezar cento & trinta arrateis, huns annos por outros. Esta devoçaõ dizem tivera principio de haver naquella terra hum monstro, ou hú animal que destruhia os campos, & matava a gente, & que para se livrarem deste trabalho, fizeraõ voto à Senhora de ir naquella fórma à sua Casa, cada anno, no dia referido, com que se viraõ livres. E apregoaõ, que faltando hum anno nesta devoçaõ se viraõ outra vez perseguidos da féra, que seria a infernal. Cada anno se fazem à Senhora tres feyras, nas festas principaes, a saber, na da Annunciaçaõ, Assumpçaõ, & Natividade. Obra esta Senhora muytas maravilhas, & milagres, & os fez em alguns navegantes, seus naturaes, que em perigosas tormentas imploráraõ o seu favor, que acháraõ promptissimo, & assim em agradecimento indo visitar a Senhora, lhe oferecéraõ algunas peças, & vestidos ricos. A Imagem da Senhora he de escultura de madeyra, & terá de estatura cinco palmos. Da Senhora de Sacaparte escrevem o Padre Vasconcellos na sua Descripçaõ do Reyno de Portugal pag. 539. num. 16. & a Monarchia Lusitana part. 5. liv. 16. cap. 51.

Sacaparte - Descrição do Santuário antes de 1710


SANTUARIO MARIANO

E Historia das Imagens milagrosas
DE NOSSA SENHORA


TOMO SETIMO
QUE OFERECE, CONSAGRA, E DEDICA,
AO EMINENTISSIMO, E ILLUSTRISSIMO SENHOR CARDEAL
D. NUNO DA CUNHA,
Inquisidor Geral do Reyno de Portugal


Fr. AGOSTINHO DE SANTA MARIA,
Ex-Vigario Geral da Congregaçaõ dos Agostinhos Descalços, & natural da Villa de Estremoz.


LISBOA OCCIDENTAL,
Na Oficina de ANTONIO PEDROZO GALRAM

Com todas as licenças necessarias:
Anno de 1721,



Página 395 a 400


T I T U L O  XLI.
A milagrosa Imagem de N. Senhora de Sacaparte.

           

            No terceyro tomo destes nossos Santuarios, Liv. 2. tom. 12 escrevemos da Senhora de Sacaparte, & do seu Santuario, situado junto à Villa, & praça de Alfayates, no Bispado de Lamego; dos principios desta Santissima Imagem dissemos o que pudemos alcançar pelas tradiçoens antigas, naõ faz dúvida que ali haveria alguns encontros de guerra entre Dom Alvaro Nunes de Lara; & a gente delRey Dom Sancho o Bravo de Castella, com que elle estava desavindo; & assim de tal lida, ou batalha naõ ha quem della diga cousa alguma com certeza.

                   O que o Reverendo Padre Valerio Monteyro nos diz em huma Relaçaõ, que nos fez, em que refere algumas cousas mais do que tinhamos escrito, accrescenta em como ElRey Dom Diniz fora o que fundara aquella casa, & a dedicàra à Virgem Senhora de Sacaparte, o que se verificava nas Reaes Armas, que se vem em o Retabolo, que elle quer o mandasse fazer o mesmo Rey, & o faria obrigado de algum grande favor, que receberia da Senhora, que fosse já venerada de muytos annos naquelle sitio em alguma Ermida, & elle por devoçaõ da Senhora a reedificaria, & a faria na fórma, & grandeza que hoje se vè; porque he Templo grande, & o Santuario de mayor frequencia de toda a Beyra alta, & bayxa, & tambem de Castella, porque de muytas Cidades, & Villas he buscada com fervorosa devoçaõ.

                   Refere o mesmo Padre Valerio Monteyro, como quem assistio muytos annos àquella Senhora, prégando muytas vezes na sua casa, ser esta Imagem da Mãy de Deos visitada de todas as Villas da Beyra alta, & bayxa, & descreve a sua Igreja, dizendo estar situada em hum grande rocio, ou campo, entre a praça de Alfayates, & a Raya de Castella huma legoa, & que a casa da Senhora fica no meyo, & assim dista de huma, & outra parte meya legoa, diz mais, que o sitio he hum valle muyto alegre, & ainda que ermo agradavel; tem por alli muytos montados, & grandes matas, & hum grande Pinhal, aonde saõ muytos os veados, & as corças, & muyta quantidade de javalizes,& tambem haveria por alli muytos ussos,& podia bem ser, que ElRey Dom Diniz fizesse naquellas matas algumas Cassadas, exercício de que muyto gostava, & escapasse por favor de nossa Senhora de Sacaparte de outro semelhante perigo, como lhe succedeo em Beja, aonde escapou de hum usso, por favor de Saõ Luiz Bispo de Tolosa; aqui lhe poderia succeder outro semelhante, aonde invocando a Senhora, ella o livraria delle, & em acçaõ de graças lhe reedificaria a sua antiga Ermida, & se constituiria seu perpetuo Padroeyro, & mandaria fazer entaõ o retabolo, & em memoria lhe mandaria pôr nele as suas armas, o referido Padre Valerio Monteyro diz, que ElRey Dom Diniz fora o Fundador, & que os Reys de Portugal seus Successores saõ os Padroeyros daquella casa da Senhora, o que confirma com huma sentença de desaggravo, & traz algumas clausulas em que se vè a verdade da mesma sentença, que está no Cartorio da Camara daquella Villa de Alfayates, dada no Juizo da Coroa a favor dos Oficiaes da mesma Camara, contra o Ordinario de Lamego, da qual refere estas palavras:

Dom Felippe por graça de Deos, &c. A vós Bispo da Cidade, & Bispado de Lamego, &c. ibi. De nossa Senhora de Sacaparte, que foy instituida por ElRey Dom Diniz, que está no Ceo, cuja immediata protecçaõ era sua, & dos Reys passados, & minha; sempre servida, & administrada por pessoas leygas: & mais abayxo: & como se mostra estar em posse immemorial de alevantar hum Altar portatil na Igreja de nossa Senhora de Sacaparte, onde põem huma Imagem do Menino Jesus, & as ofertas, que no dito Altar se oferecem, serem para a fabrica da dita Igreja, para o que tem mordomos elleytos em Camara, &c. Porto 14 de junho de 1603.
O Doutor Gonçalo de Faria, & Andrada,

                   Daqui se vê certamente que esta Igreja a fundou ElRey. Dom Diniz, ou a reedificou, se he que já ali existia, & quanto ao título de Sacaparte, poderia por aquelle milagre, ou por outro darse-lhe à Senhora o título de Sacaparte.

                   E tornando ao sitio da casa da Senhora, se diz ter huma pequena parede, no qual ha humas amoreyras muyto antigas, cujas sombras servem aos devotos, que vaõ fazer as suas romarias, & para os Mercadores, que vaõ às feyras, dentro deste terreyro ha duas grandes casas de hospedaria de huma, & outra parte da casa da Senhora, mas separadas da Igreja, em fórma, que fica lugar para as procissoens que fazem as Villas, & lugares dos que vaõ a fazer as suas romarias, em huma destas assiste o Ermitaõ, & na outra se conservaõ colxoens, & algumas roupas, para as pessoas graves, & de mayor supposiçaõ, & como as casas saõ grandes, saõ muyto capazes de se alojar nellas muyta gente, nos bayxos tem estrevarias para se acomodarem as bestas.

-
                                                                                               Tem aquella Igreja da Senhora tres Capellas, a mayor, que he grande, & espaçosa, & duas collateraes, huma destas he dedicada a Saõ Joachim, & a outra à Senhora Santa Anna, ambas tem retabolos de muyto boa talha moderna, & bem dourados, a Capella mòr tinha hum retabolo muyto perfeyto, & de valente architectura, ainda que antigo, & no alto delle as Armas Reaes de Portugal, mas os Mordomos da Senhora como desejo de lhe fazerem outro retabolo de obra moderna com sua tribuna, quizeraõ primeyro levantar mais a Capella, & fazerlhe huma perfeytissima simalha que já está feyta, & o tecto ricamente forrado, que se acabou já ha annos, & custou trezentos mil reis, & esta obra se começou no anno de 1710. Tambem creyo, que o retabolo estarà assentado, obra no meu parecer escusada, pois lançariaõ fóra os preciosos quadros de pintura, que naõ podem ser melhores os que vem de Roma.

                   Tem esta Igreja da Senhora tres portas, a principal, & duas collateraes; huma dellas fica ao Norte, & a outra para o Sul, a principal fica para o Occidente, & tem huma alpendrada, como a de nossa Senhora de Nazareth do sitio da Pederneyra, que começando da Capella mòr corre atè à porta principal, & della vay continuando atè à referida Capella mayor, tem tambem a Senhora hum poço dentro na mesma Igreja de excelente, & miraculosa agua (como já dissemos,) & de tanta copia de agua, que por mais que se tire delle, se lhe naõ vê diminuiçaõ, & sendo nas occasioens das festividades, & feyras infinita a gente, naõ faltou nunca agua para todos, & como esta agua he milagrosa, podemos entender que a Senhora se manifestaria sobre aquelle poço, ou que nelle obrou a Senhora alguma maravilha.

                   A Imagem da Senhora de Sacaparte he de escultura de madeyra incorruptivel, sua estatura saõ cinco palmos; o rosto he redondo; mas de muyta fermosura, & ricamente encarnado, que parece está viva, & fallando com os seus devotos que a buscaõ, naõ tem Menino; a devoçaõ dos seus devotos a tem sempre vestida de preciosas tellas, & sedas; naõ só he a devoçaõ de toda a Beyra, mas de muyta parte de Hespanha, como da Serra de Gata, Bispado de Coria, campo de Arganhaõ, Bispado de Cidade Rodrigo.

                   Já dissemos no terceyro tomo em como concorriaõ a esta romaria a Villa do Sabugal, Villar mayor, Castello Mendo, Castello Bom, & Castello Branco, & de todos os lugares dos seus termos; as procissoens que se lhe fazem por estes seus devotos, vem acompanhadas dos seus Parocos, & com as suas Cruzes, tem a Senhora algumas fazendas, que se lhe deyxàraõ; para que dos seus rendimentos se acuda às despezas do seu culto, & fabrica, aonde se ajuntaõ tambem o procedido das ofertas, & esmollas, que saõ muytas, & naõ haver quem as divertisse, se podia cobrir de ouro aquelle notavel Santuario da Senhora de Sacaparte.

                   Refere o Padre Valerio Monteyro com muyta extençaõ a entrada que faz todos os annos a Villa de Castello Mendo, & seu Conselho com a sua Camara incorporada, aonde vay muyta gente de cavallo, & de pè, & toda muyto lusida armados de espingardas, & entraõ na segunda feyra primeyra oytava da Pascoa da Resurreyçaõ com grande ordem, que parece hum exercito formado, fazem a sua entrada ao redor da Igreja, & fazem suas festas, & carreyras; neste dia concorre assim da Praça de Alfayates, como de todas as Povoaçoens visinhas muyta gente a ver esta notavel entrada, & nella vaõ dezoyto homens nús da cintura para cima, & cada hum delles leva hum grande cirio, & saõ dezoyto lugares do mesmo Conselho de Castello Mendo os mais populosos, neste dia manda o Governador da Praça de Alfayates hum Cabo com huma esquadra de soldados, para que assistaõ, & impidaõ qualquer perturbaçaõ, ou pendencia que possa haver, muytas outras cousas maravilhosas puderamos referir, como tambem a causa de irem aquelles dezoyto homens meyos nús com os cirios nas maõs, que oferecem à Senhora, os quaes saõ taõ grandes, que todos pezaraõ mais de cento & quarenta arrateis, vay tambem o Paroco de Castello Mendo, Vigario de Saõ Vicente que he o que preside naquella festividade, & os Oficiaes da Camara saõ hoje os que levaõ a Capa de Asperges ao Vigario de Saõ Vicente por obsequio que lhe fazem. O mais que puderamos aqui dizer, omitimos pelo haver já dito no terceyro tomo, aonde os curiosos o poderaó ver.

Quanto às maravilhas, milagres, & prodigios, que a Senhora tem obrado, & continuamente obra, saõ muytos, & notaveis os que se referem, mas como no los deraõ escritos, os naõ referimos, da Senhora de Sacaparte, escrevem alguns Historiadores Portuguezes, como he Brandaõ na quinta parte, & o Padre Vasconcellos na sua discripçaõ, aonde diz, que he muyto antigo este Santuario, porque quando os Mouros foraõ lançados daquelas terras, era já ennobrecida aquella casa da Senhora, com milagres, & maravilhas, & a Senhora venerada de todos os fieis daquellas partes.

Em Alfaiates - Tropas de Wellington Reunidas





 HISTORIA
DA
GUERRA CIVIL
E DO
ESTABELECIMENTO DO GOVERNO PARLAMENTAR
EM
PORTUGAL
Comprehendendo a historia diplomatica, militar e politica deste reino
desde 1777 até 1834

POR
SIMÃO JOSÉ DA LUZ SORIANO


SEGUNDA EPOCHA
GUERRA DA PENINSULA
TOMO III


LISBOA
IMPRENSA NACIONAL
1874




Páginas 598 a 600
(25-26-27-28 de setembro de 1811)

                        Reunidas como finalmente se viram todas as tropas aliadas, pôde dizer-se que em Fuente Guinaldo se achava postado o centro do seu exercito, tendo a sua ala direita estabelecida na passagem de Perales, e a sua ala esquerda em Nave de Aver. Na manhã de 26 Marmont pareceu querer seriamente atacar os aliados, mas lord Wellington não esperou por isso, pois que apenas viu reunidas todas as suas tropas, levantou o seu campo, e com elas se retirou por um habil movimento concentrico para um novo terreno entre o Côa e as nascentes do Agueda, tres a quatro leguas mais para a retaguarda de Fuente Guinaldo, onde se havia demorado trinta e seis horas, contadas desde o meio dia de 25 até á meia noite de 26, não obstante a viva inquietação, que lhe causou a demora da divisão ligeira do general Crawfurd.

                        Na sua nova posição lord Wellington colocou o seu exercito pelo seguinte modo. A quinta divisão foi posta á direita da Aldeia Velha; a quarta, os dragões ligeiros e a cavallaria de Victor Alten no convento de Sacaparte, adiante de Alfaiates: a terceira e setima divisões em segunda linha, por trás de Alfaiates: o corpo do commando do general Graham na esquerda de Bismula, tendo a sua vanguarda para alem da ribeira de Villa Maior; a cavallaria do tenente general sir Stapleton Cotton perto de Alfaiates; á esquerda da quarta divisão, tendo a mesma cavallaria pela sua esquerda, as brigadas dos generaes Pack e Mac-Mahon em Rebolosa. Os piquetes de cavallaria estavam adiante da Aldeia da Ponte, para alem da ribeira de Villa Maior, e os do general Victor Alten para alem da mesma ribeira em Forcalhos. No dia 27 Marmont atacou os postos avançados da Aldeia da Ponte, da qual se assenhoreou depois de uma encarniçada luta, cousa que nenhuma vantagem lhe trouxe. Neste combate, que nós denominamos de Alfaiates, e Napier lhe chama da Aldeia da Ponte, tomaram parte os seguintes corpos portuguezes: cavallaria n.° 1, infanteria n.° 1, 9, 11, 13, 16, 21, 23 e 24; caçadores n.° 1, 3, 4, 5 e 7, e artilheria n.° 2, perfazendo o total de 10:173 homens.

                        No seguinte dia (28) lord Wellinglon, suppondo no duque de Ragusa a intenção de passar o Côa, estabeleceu o seu exercito nas alturas que estão por trás de Soito, tendo a sua direita apoiada na serra de Mesas, e a sua esquerda em Rendo sobre o Côa, uma legua pouco mais ou menos para a retaguarda da posição tomada no dia 27, sendo mais forte do que esta era; mas apoiando-se n’uma profunda ravina, succederia que em caso de revez, o respectivo exercito teria compromettida a sua retirada. Marmont porém, tornando-se timido diante da altiva firmeza do general inglez, e achando-se por outro lado falto de viveres, que não podia haver no paiz, retrocedeu no mesmo dia 28 para o Tejo, sem nada mais ter feito do que abastecer a Cidade Rodrigo e haver mettido n’ella uma nova guarnição de uns 2:000 homens escassos, sendo-lhe com toda a rasão estranhado que deixasse perder uma nova occasião de aniquilar um exercito, que dentro em poucos mezes o havia de aniquilar a elle. Dorsenne foi pela sua parte para Salamanca, postando-se uma divisão em Alba de Tormes, para segurança da communicação com Marmont. Foy, tendo avançado com as suas duas divisões até Zarza la Mayor, na direcção de Castello Branco, voltou para Plasencia. Girard, ameaçado pela divisão portugueza do general Hamilton, deixou 2.000 homens do quinto corpo em Merida, retirando-se elle Girard para Zafra. Desde que lord Wellington teve conhecimento d’estes movimentos ordenou que a divisão ligeira, reforçada por dois esquadrões de cavallaria, retomasse por formalidade o bloqueio da Cidade Rodrigo, de concerto com D. Julião Sanches. O resto do exercito aquartelou-se pelas duas margens do Côa, estabelecendo-se o quartel general em Freineda.





segunda-feira, 23 de março de 2020

- Da Villa de Alfayates - COROGRAFÍA PORTUGUEZA


COROGRAFÍA
PORTUGUEZA,
E DESCRIPÇAM TOPOGRÁFICA
do famoso Reyno de
PORTUGAL

TOMO SEGUNDO
OFFERECIDO
АO SERENISSIMO REY
DOM JOAM V.
NOSSO SENHOR.
AUTHOR
О P. ANTONIO CARVALHO DA COSTA
SEGUNDA EDICÄO.



BRAGA
Typographia de Domingos Gonçalves Gouvea.
Rua Nova n.° 45.
1868.




TOMO SEGUNDO
DA
COROGRAFIA portugueza.

LIVRO PRIMEYRO.
 Da Provincia da Beyra.


Capítulo XXV
Páginas 208 a 211

Da Villa de Alfayates.

                        Do rio Tejo até perto de Sabugal se corre a raya com Castella de Norte a Sul, & de sobre o lugar de Meimão corre Leste Oeste pela serra de Malcata até o lugar de Lagiosa, quatro legoas de Sabugal. De Lagiosa até o Douro corre a raya Nornordeste a Susudueste. Aonde se começa a fazer esta raya, fica a Villa de Alfayates, huma legoa della, tres ao Nascente de Sabugal, cinco ao Susudueste de Castello Mendo, & oito ao Sueste de Pinhel. Está situada em lugar alto, cercada de muros com duas portas, & trincheiras, hum Castello dentro, & fora huma Atalaya. He Villa de muita importancia, & Praça de armas, como diz o Abbade de Pera no livro 3 das Guerras da Beyra, & foy povoação de Romanos. Tem na praça hum Padrão, que serve de assento, com letras, que denotão ser do Emperador Augusto Cesar, & que foy a Villa presidio de Romanos. Quando era da Coroa de Castella, lhe chamavão Castilho de Luna. Mas aquelle se desfez, & se mudou para o sitio, que hoje occupa. Depuis se destruio esta Villa com continuas guerras, & a mandou povoar EIRey D. Affonso o X. de Leão: deo-lhe foral EIRey D. Dinis, & fundou seu Castello pelos annos de 1207, o qual reformou EIRey Dom Manoel. Tem hoje 130. visinhos com huma Igreja Parroquial da invocação de Santiago, Reytoria, que apresenta o Bispo de Lamego, & Comenda da Ordem de Christo. He abundante de pão, gado, & caça, & tem huma veyga muito plana, aonde se recolhe excellente linho, legumes, & muita hortaliça; & hum quarto de legoa distante da Villa tem huma Igreja de N. Senhora da Sacaparte, imagem milagrosa, & de grande concurso de Romeiros em todo anno.
                       
                       Assistem ao governo civil desta Villa dous Juizes ordinarios, tres Vereadores, hum Procurador do Concelho, Escrivão da Camera, outro do Judicial, & Notas, Juiz dos Orfãos com seu Escrivão, & outro das Sizas. Ao militar hum Governador com huma Companhia de lnfantaria paga de presidio, & outra da Ordenança. O seu termo tem os lugares seguintes.

                        Aldea da Ponte tem 115. visinhos com huma Igreja Parroquial da invocação de S. Maria Magdalena, Curado annexo à Igreja de Santiago de Alfayates, que apresenta o Reytor della.


                        Forcalhos tem 50. visinhos com huma Igreja Parroquial da invocação de S. Maria Magdalena, Curado annexo à mesma Igreja de Santiago.

                        Rebolosa tem 36. visinhos com huma Igreja Parroquial da invocação de S. Catherina, Curado annexo à mesma Igreja de Santiago.

                      Forão naturaes desta Villa Rui Tavares de Brito, Cavalleyro da Ordem de Christo, servio em Africa, & nas Armadas deste Reyno antes da Acclamaçâo do Senhor Rey D. João o Quarto, & depois della, tendo mais de setenta annos de idade nas fronteyras da Beyra, Tras os Montes, & Alentejo com tam estremado valor, como testemunhão nossos Escritores, particularizando acçoens suas muy heroicas. Foy Capitão de Cavallos, & Commissario da Cavallaria, & cheyo de annos, & serviços deo a vida pelo seu Rey, & pela patria.

                      Foy seu filho legitimo, & de sua mulher D. Joanna de Tavora, Gaspar de Tavora & Brito, Cavalleiro da mesma Ordem, Capitão de Couraças, Mestre de Campo de hum Terço pago no Alentejo, igual no valor a seu pay, & por elle bem conhecido.

                      De Gaspar de Tavora & Brito foy filho legitimo João Martins de Tavora, Cavalleiro da Ordem de Christo; Capitâo de lnfantaria, imitador de seu pay & avo no esforço, & fidelidade. Servio esta Coroa ate o tempo das pazes com Castella, & depois no Terço da Armada, & ultimamente foy Governador, & Capitão mór de Benguella, onde morreo, & delle ha successão legitima na Cidade de Leyria, & no lugar do Beco, termo da Villa de Dornes da Comarca de Thomar.

                        Antonio de Tavora, irmão do Capitão João Martins de Tavora, & filho legitimo de Gaspar de Tavora & Brito, foy Sargento mor de Batalha nos Estados de Flandes, & delle ha successão legitima em Lisboa.

                      Bernardino de Tavora, filho iIlegitimo do dito Gaspar de Tavora, foy Capitão de lnfantaria, & Sargento mor da Comarca de Setuval.

                   Todas estas pessoas forão muy valerosas pelas armas, & delles fazem menção os nossos Escritores modernos, principalmente o Doutor João Salgado de Araujo, Abbade de Pera no livro que intitula, Successos Militares das Armas Portuguezas em suas Fronteiras depois da Real Acelamaçâo contra Castella, impresso em Lisboa na officina de Paulo Craesbeeck anno do 1644. onde alem de outras muitas, relata huma façanha de Rui Tavares de Brito no liv. 3. cap. 19. tratando de huma entrada, que os Castelhanos fizerao na Beira, aos quaes sahio o dito Rui Tavares de Brito com a sua tropa, & algumas mais, & travando peleja com o inimigo, o desbaratàrão, & puzeram em fugida, & com palavras formaes diz o seguinte.

                     Retiravãose tambem os nossos, quando Rui Tavares de Brito, Cavalleiro da Ordem de Christo, & Capitão de Cavallos, Soldado que fora nas Armadas do Reyno, & Cavalleiro Africano de mais de setenta annos de idade, reparando em si, se achou menos hum alfange, que costumava trazer: poz esporas a seu cavallo, & com sua lança de peleja entrou pelos inimigos, cobrou seu alfange, descativou a Luis Carrilho, que o inimigo levava, ajudado tambem do Ajudante Ferreyra, que tambem se ouve valerosamente, que ambos o seguirão, vendo-o começar tam honrado feito, & se tornou. Por certo, acção que merece ser venerada. Era destrissimo na lança, como Africano, & não se atrevião os Castelhanos chegar a elle, &c.

                 Tambem Bernardino de Tavora, irmão de Gaspar de Tavora & Brito, foy Inquisidor Apostolico da Mesa do S. Officio de Lisboa.

                  He senhor desta Villa Aleyxo de Sousa da Sylva & Menezes, Conde de Santiago, cuja varonia he a seguinte.

                        Rui de Sousa da Sylva foy filho de Rui Gomes da Sylva, primeiro senhor de Ulme, & da Chamusca, & dos Reguengos de Nespereyra, Villa-Nova de Foscoa, Monção, & de Riba do Vouga, & de D. Felippa de Andrade sua terceira mulher: casou com D. Leonor de Noronha, filha de D. Martinho de Castello-Branco, primeiro Conde de Villa-Nova de Portimaö, senhor do Morgado da Povoa, Veador da Fazenda dos Reys D. João o Segundo, & D. Manoel, Governador de Lisboa, & Camareiro mor delRey D. João o Terceiro, & da Condeça D. Mecia de Noronha sua mulher, de que teve, entre outros filhos, a

                 Lourenço de Sousa da Sylva, que foy senhor da Casa de seu pay, & Aposentador mor delRey D. João o Terceiro: casou com Dona Isabel de Èça, filha herdeira de D. Jeronymo de Eça, & de D. Maria Tibao sua mulher, de que teve, entre outros filhos, a
                       
                        Manoel de Sousa da Sylva, que foy Aposentador mor delRey D. Sebastião, & Commendador de Guilhefrey, & Alfayates na Ordem de Christo por merce do mesmo Rey, com o qual passou a Africa, & o matarão a seu lado na batalha de Alcacer no anno de 1578. casou terceira vez com Dona Anna de Vilhena, filha de Luis Alvares de Tavora, senhor do Mogadouro, & de outras terras, & de D. Felippa de Vilhena sua mulher, irmãa do segundo Conde de Sortelha, & desto matrimonio nasceo, entre outros filhos, o seguinte.

                        Lourenço de Sousa da Sylva foy Aposentador mór, & Cõmendador de Santiago de Beduido na Ordem de Christo, & de Guilhefrey, & Alfayates: casou com. D. Luiza de Menezes, senhora do Reguengo de Arronches, & Aya dos Reys de Portugal D. Affonso o Sexto, & D. Pedro o Segundo, a qual era filha de D. Alvaro de Menezes, Alcayde mor, & senhor do Reguengo de Arronches, & de sua mulher D. Violante de Ataide, de que teve, entre outros filhos, a

                        Aleixo de Sousa da Sylva, que foy Aposentador mor delRey D. Felippe о Quarto, & senhor da Casa, & Commendas de seu pay: casou com D. Luiza de Tavora, filha mais velha de Luis de Miranda Henriques, Cõmendador, & Alcayde mor de Cabeça de Vide, & de sua mulher D. Guiomar Guedes de Tavora, senhpra de Murça, & outras terras, de que teve filho unico a

                        Lourenço de Sousa da Sylva & Menezes, que foy Aposentador mór, & primeiro Conde de Santiago de Beduido por merce delRey D. Affonso o Sexto, senhor do Reguengo de Arronches, Commendador de Santiago, & Guilhefrey na Ordem de Christo, Mestre de Campo do Terço de Moura, & Sargento General de Batalha: casou com D. Joanna da Svlva, Dama da Rainha D. Luiza de Gusmão, filha de João de Saldanha da Gama, que morreo no Alentejo sendo Capitão de Cavallos, & de D. Margarida de Vilhena & Sylva sua mulher, & deste matrimonio nam ouve filhos: casou segunda vez com Dona Luiza Maria de Mendoça, tambem Dama da mesma Rainha D. Luiza de Gusmão, & filha mais velha de Nuno de Mendoça, segundo Conde de Val de Reys, Alcayde mor da Cidade de Faro, & das Villas de Loulé, & Albufeira, Cõmendador de S. Miguel de Armamar, S. André de Tuizelo, Montecorvo, & S. Lourenço de Villa Cova na Ordem de Christo, do Conselho de Estado, Gentil-homem da Camera, do Principe Dom Theodosio, Governador do Reyno do Algarve, & Presidente da Camera de Lisboa, & da Condeça Dona Luiza de Castro & Moura sua mulher, de que teve a Aleixo de Sousa, Dona Luiza de Mendoça, & D. Luzia de Menezes, Dama da Rainha D. Maria Sofia, que casou com D. Pedro de Castello-Branco, terceiro conde de Pombeiro, & Capitão da Guarda de Sua Magestade.

                        Aleixo de Sousa da Sylva & Menezes he segundo Conde de Santiago de Beduido, Aposentador mor delRey D. Pedro o Segundo, Comendador de Santiago, & Guilhefrey, & senhor do Reguengo de Arronches: casou com D. Leonor Maria de Menezes, filha de Dom Fernando Mascarenhas, segundo Marquez de Fronteira, & da Marqueza D. Leonor de Menezes sua mulher.